“Paralisação nos EUA: quais os impactos econômicos — e o que investidores brasileiros devem observar”

Recentemente, os Estados Unidos entraram numa fase de paralisação do governo federal (shutdown), após o Congresso não aprovar a legislação orçamentária para financiar as operações do Estado. 

Embora esse tipo de paralisação não seja raro (já houve diversas ao longo das últimas décadas)  , o momento econômico global e a interconexão dos mercados fazem com que os efeitos possam reverberar com mais intensidade para economias emergentes, como a do Brasil.

Neste artigo, vamos analisar os principais efeitos esperados — para os EUA e para o Brasil — e apontar o que investidores e cidadãos devem ficar atentos.

O que é uma paralisação (shutdown) e por que ocorre

Nos EUA, o governo federal depende da aprovação de leis de “appropriations” (dotação orçamentária) para financiar seus órgãos e atividades. Se o Congresso não aprova essas leis ou resoluções temporárias antes do início do ano fiscal, muitos órgãos ficam sem verba para operar.  Durante o shutdown, operações consideradas “essenciais” (relacionadas à segurança, saúde crítica, defesa etc.) continuam a funcionar, mas muitos outros serviços são suspensos ou reduzidos, e servidores considerados “não essenciais” são colocados em regime de furlough (licença sem remuneração) ou trabalham sem garantia imediata de pagamento.  Uma regra importante: nos EUA existe uma lei aprovada após o shutdown de 2018-2019 que garante que servidores federais e militares vão receber o pagamento retroativo quando a paralisação terminar (isto é, não perdem o salário permanentemente) 

Principais impactos nos EUA

Efeito no PIB e no crescimento econômico

Em shutdown curtos (dias a semanas), o impacto costuma ser limitado, mas já há estimativas de que cada semana de paralisação pode reduzir em cerca de 0,1 a 0,2 ponto percentual o crescimento do PIB anualizado naquele trimestre.  Por exemplo, a paralisação de 35 dias no fim de 2018 até início de 2019 foi estimada em cerca de US$ 11 bilhões de perdas de atividade econômica total, sendo que parte desse valor talvez não seja totalmente recuperada.  Além disso, atrasos em contratos e compras governamentais, adiamento de projetos públicos e decisões de empresas privadas (por conta da incerteza) podem ter efeitos negativos colaterais. 

Servidores públicos e consumo doméstico

Muitos servidores federais serão afetados: sem receber salário durante a paralisação, tendem a reduzir gastos pessoais, o que reduz o consumo doméstico — um componente importante da economia americana.  Contratados e fornecedores do governo que dependem de pagamentos federais também podem sentir forte impacto. 

Atraso em dados econômicos e decisões de política monetária

Agências como o Bureau of Labor Statistics (BLS) podem suspender ou atrasar a divulgação de dados de emprego, inflação e outros indicadores econômicos.  Essa falta de informação complica a tomada de decisões do Federal Reserve (o banco central dos EUA), que depende desses dados para ajustar juros, avaliar risco de recessão etc. 

Impactos setoriais específicos

Turismo e transporte: parques nacionais, museus e outras atrações fecham, reduzindo receitas do turismo.  Aviação: atrasos em inspeções, manutenção e fiscalização podem ocorrer.  Serviços de apoio governamental: emissão de vistos, licenças, certificações federais etc. tendem a ser afetados.  Segurança, saúde pública e pesquisa podem ver operações reduzidas em programas não prioritários. 

Risco de rebaixamento de rating e incerteza fiscal

A paralisação sinaliza incerteza institucional e falta de capacidade de consenso político, o que pode pesar na avaliação de risco soberano dos EUA. De fato, a agência de classificação Scope advertiu que o shutdown é um fator negativo para o crédito americano.  Se a paralisação coincidir com disputas sobre o teto da dívida (debt ceiling), o risco de inadimplência cresce ainda mais, o que geraria consequências mais severas. 

Impactos para o Brasil e para investidores brasileiros

Efeito nos mercados emergentes e câmbio

Em momentos de tensão nos EUA, investidores tendem a buscar ativos considerados mais seguros, como o dólar e títulos de países desenvolvidos, o que pode gerar fuga de capital de mercados emergentes, pressionando suas moedas locais. Já há alertas de que a paralisação nos EUA pode provocar saída de investidores de países como o Brasil.  Isso pode levar ao fortalecimento do dólar frente ao real, o que encarece importados, pode alimentar inflação e elevar custos de financiamento de empresas brasileiras que tomaram dívida em dólares. 

Bolsa, juros e risco-país

A instabilidade internacional pode aumentar a aversão ao risco, elevando os prêmios cobrados sobre títulos brasileiros e pressionando os juros domésticos. O Ibovespa costuma reagir negativamente a choques externos de confiança, e um cenário de incerteza americana pode levar a queda nos mercados acionários brasileiros no curto prazo. 

Comércio e cadeias de valor

Os EUA são um parceiro comercial importante para o Brasil. Se a paralisação impactar importações/exportações — por atrasos alfandegários ou burocráticos —, o comércio bilateral pode sofrer. Empresas brasileiras que exportam para os EUA podem ver pedidos adiados ou consumo americano em retração, especialmente se o impacto econômico nos EUA for mais duradouro.

Oportunidades relativas

Por outro lado, em caso de desvalorização do real e de maior interesse estrangeiro em mercados emergentes “baratos”, pode surgir espaço para entradas de capital no Brasil — se o país for percebido como mais estável. Alguns especialistas já levantam essa hipótese. 

O que observar de perto — dicas para investidores e economistas

Duração da paralisação Quanto mais tempo durar, maior será o efeito acumulado. Paralisações curtas tendem a ter impacto limitado. Liberação de dados econômicos nos EUA Fique de olho em atrasos na divulgação de empregos, inflação, produção industrial etc. Esses dados são fundamentais para monitorar tendências macro. Decisões do Federal Reserve Se o Fed perder visibilidade sobre a economia por causa de lacunas de dados, pode haver maior volatilidade nos juros de longo prazo e nas expectativas de política monetária. Fluxos de capital e câmbio Monitorar entradas e saídas de capital de mercados emergentes e movimento do dólar frente ao real. Setores sensíveis no Brasil Empresas exportadoras para os EUA, empresas com dívidas em dólar ou que dependem de importados podem ser mais vulneráveis.

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